Sempre tive preguiça de escrever sobre aborto: tinha – e tenho – medo de cair naquela repetição social que, sendo verdade ou não, todo mundo já conhece: “abortar é matar uma vida”, “abortar é uma escolha da mulher”, “abortar é uma escolha do casal”. Que “cada um tem sua religião”, “cada um tem o seu corpo”, “cada um tem a sua crença e cada um faz com ela o que bem entender”.
Legal essa independência toda, mas será que somos realmente tão independentes assim? Será que o meu corpo é realmente apenas o meu corpo e por isso posso fazer o que bem entender com ele? E se isso interferir na vida de terceiros? Não só da família, da Igreja ou do pai da criança, mas sim em um mal-estar social, que ao pregar o bem-estar em demasia, pode acabar gerando justamente o contrário. Explico melhor no decorrer desse texto.
Todo mundo sabe que quando o papo é aborto, a briga parece muito mais entre homem e mulher do que pela causa em si. Algumas mulheres afirmam que o homem que diz que a mulher que engravidou é culpada porque foi irresponsável é um machista sem noção, pois se ela engravidou, é porque, com o perdão da palavra, ele estava com o p** lá dentro e concordou com o ato. E algumas ainda dizem mais: “se ele é contra o aborto, que faça vasectomia“! Já o homem se defende:
“Na hora de decidir entre abortar ou não, a mulher diz que o corpo é dela e é ela quem decide, mas se ela opta por ter o filho, elas nos obrigam a pagar pensão. Por que então a gente tem que pagar se ela fala que o corpo e o filho é dela? O filho seria “dela” ou “nosso” a depender da conveniência?”. Assinado: um homem.
Brigas de Lulu e Bolinha à parte, vamos ao óbvio: tirando os casos de estupro e demais violências sexuais que teriam que ser debatidas à parte, se os dois toparam – se arriscaram, ou como você quiser chamar – transaram sem proteção – ainda mais quando não desejam ter filho(s), ambos têm responsabilidades semelhantes, ou melhor, ambos são irresponsáveis. I-R-R-E-S-P-O-N-S-Á-V-E-I-S.
Claro que ninguém quer admitir que ficou com a cabeça oca por um momento, fez m**** pelo único motivo do tesão ou por achar “que rapidinho nem ia dar nada”, e aí prefere colocar tudo nos direitos da liberdade sexual, direitos do homem, direitos da mulher, direitos do papagaio e sei lá mais o quê. Como se não soubessem que o direito de um termina justamente quando começa o do outro. Você já parou para pensar que desde que inventaram isso de liberdade sexual as pessoas ficaram mais egoístas? “Eu faço o que quiser com o meu corpo. Ele é meu e dane-se o resto“. Dane-se?
Um parênteses: você já reparou que adoramos julgar a irresponsabilidade alheia (me incluo nessa), mas quando o erro é nosso, adoramos falar que “o problema é nosso e ninguém se mete”(?). Paradoxalmente, bem que adoramos nos meter na vida do cara/mulher que só nos usou e jogou fora, da biscate(o) que dá em cima de quem você gosta e de várias outras atitudes que julgamos erradas. Por quê? Porque ainda que nos enganemos dizendo que não temos nada a ver com a vida dos outros, nem eles com a nossa, sabemos que no final das contas tudo tem a ver com tudo! É como a teoria do caos: você dá um espirro aqui, e uma coisa explode lá no Japão. Só que é claro que eu não posso dizer qual consequência o espirro da sua irresponsabilidade dará. Isso ficará a cargo do destino: o meu é só ver se consigo colocar um pouco de “pensar antes de agir” na sua cabeça.
Toda mulher conhece aquele papinho básico e clichê do homem na hora da transa: “vai ser rapidinho, e nem vou gozar dentro“, “deixa só eu te sentir um pouco“, “prometo que não vou gozar dentro“. Nessa o homem também se defende: “É, mas tem muita mulher que se não fosse eu lembrar de colocar a camisinha, ela também não fazia questão não!” E ambos constantemente dizem: “Se a mulher toma anticoncepcional, tá de boa“. Sei que o papo aqui é aborto: mas e HIV, você não tem medo não? E as outras DSTs, o que você diz? E se a parceira tomou o anticoncepcional errado e “deu merda”, aí faz o quê? Paga para ver se ela engravida, para aí decidir se aborta ou não, ou opta por dois métodos contraceptivos já na hora “H” para não correr o risco de ter que tomar uma decisão tão séria posteriormente?
Com tamanha liberdade sexual e sem menosprezar as consequências positivas que ela trouxe, o que vemos aqui é uma irresponsabilidade generalizada, não só em relação às doenças, como em relação aos filhos. Você pode achar lindo essa liberdade dos prazeres carnais – e acredite, eu também acho, mas você não pode achar mais fácil fazer um aborto, do que simplesmente confiar em métodos contraceptivos. Você também não pode confiar naquela de “gozar fora” e demais estratégias amadoras: confie na camisinha, bem colocada, é claro! Não interessa a sua religião ou sua filosofia pessoal: você não pode acreditar que é mais fácil ceder à uma relação sexual que te trará riscos, do que dizer um “não!”. Você não pode pensar que é mais fácil comprar remédios contrabandeados para você cometer um aborto (e caros), do que pensar antes de abrir as pernas (ou pegar alguém de perna aberta em caso de você ser um homem!). Sem contar os efeitos colaterais bizarros que algumas “mamães que não quiseram ser mamães” têm. Isso quando a mesma não morre depois de ter recorrido à métodos clandestinos. Não, você não pode pensar nada disso. Na verdade, você tem que pensar, não deixar de pensar. Você tem que acreditar que o método mais fácil é sempre pensar e se cuidar, e claro, cuidar do outro também (lembra da história do espirro, né?).
Remendar coisa quebrada é sempre muito mais difícil do que não ter deixado quebrar. Um método contraceptivo é sempre pouco, dois podem ainda ser falhos, sem usar nada pode ser a morte (pense nisso com a conotação que preferir).
Quer transar? Quer ser o revolucionário(a) sexual? É ninfomaníaco(a)? Adora um sexo sem compromisso? Então por favor, tenha responsabilidade. Não adianta você pagar de defensor das liberdades sexuais e humanas se você nem sabe o que isso significa. Ou se sabe, nem sabe usar corretamente, mas apenas convenientemente. Liberdade boa mesmo é quando você sabe o que está fazendo, quando sabe que realmente é difícil se segurar naqueles 10 segundos de tesão absurdo, mas que se você respirar fundo e deixar chegar nos 11 segundos, você já terá raciocinado o bastante a ponto de não deixar acontecer.
Não sei se você é pai, mãe, ou até mesmo tem um irmãozinho, sobrinho ou qualquer outra criança linda perto de você, mas tenho certeza que se você pensasse “e se ela não tivesse nascido?”, você iria sofrer. Você sofreu estupro? Violência? Foi forçado(a) a algo? Não? Então é porque certamente você pode controlar essa parte do seu destino.
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Já assistiu ao meu vídeo: “Sexo com camisinha pra quê, se sem é mais gostoso?”