Eu não gosto de futebol, não costumo assistir aos jogos, mas nessa Copa eu abri duas exceções. Uma para ver uma grande amiga e usei como pretexto o jogo para reforçar o nosso vínculo social, e claro, a nossa amizade. E a outra foi ontem – o inesquecível dia 08 de Julho. Resolvi ligar a TV depois de ouvir que estavam comemorando vários gols em uma torcida de algum apartamento distante do meu. A cada gol que surgia, era sempre acompanhado de uma comemoração discreta. No começo pensei que é porque os curitibanos são discretos mesmo: até então dois gols em um curto período de tempo, só podia ser do “gigante Brasil”! Depois entendi que aquele grupinho vibrando era de alemães residentes na cidade mesmo.
“Tá, mas o que você, que é uma blogueira que fala sobre relacionamentos, tem a ver com o Jogo do Brasil?” Nada, ou melhor, tudo! Quer dizer, depende do ponto de vista. Se lervarmos em consideração que autoestima tem tudo a ver com o que está acontecendo no Brasil, aí sim entro nesse post com dignidade!
Noto uma carência muito grande nos brasileiros. Um povo sorridente que, apesar de todo o carisma, tem uma carência afetiva enorme. Nos contentamos por não termos hospitais, nem boas escolas. Minto, certas vezes a gente até reclama e se faz de bravo revolucionário insatisfeito, mas a verdade é que a revolta dura pouco tempo e nos acostumamos a isso: nos acostumamos a ser o país que só se orgulha do futebol e do carnaval, porque de resto, nunca tivemos mesmo.
Há quem diga que não rola saudades do que nunca se teve (acho que não, mas na prática realmente parecemos acostumados) e isso se prova facilmente quando não vemos ninguém vestir a camisa da luta pela dignidade com tanto fervor de quando veste a camisa do Brasil na Copa. Muitos sabem completar álbuns de figurinhas, mas terminar de ler um livro que é bom, poucos conseguem. Conseguimos dinheiro para comprar a camiseta oficial da seleção brasileira, mas economizar para fazer aquele curso técnico que melhoraria a nossa vida fica para depois, porque é “muito caro”.
Não tem como não pensar: será que não estamos exagerando ao espelhar a nossa felicidade na vida dos outros e deixando de fazer por nós mesmos e pela nossa família, o que fazemos sem reclamar por terceiros? Sei lá, eu suponho que o Neymar nem te conhece, mas a sua esposa te conhece muito bem e certamente ficaria feliz se você torcesse pelo sucesso dela que nem você torceu quando o “É Tóis” se machucou.
Estamos com a autoestima baixa demais e uma das poucas coisas que restou para termos orgulho foi o carnaval e o futebol. E agora que o futebol se foi por algumas Copas seguidas, vai fazer o quê para sentir orgulho? Porque de brasileira pelada convenhamos que ninguém nunca teve orgulho de verdade.
Enfim, o que você acha de considerar essa vergonha e frustação como uma mensagem para cuidar mais da sua vida e do seu sucesso pessoal? Você pode não ser famoso, mas certamente sua família saberá das suas vitórias em caso de você correr atrás e merecer conquistá-las.
Penso que essa história de torcer e sofrer com tanto fervor a partir da vida de terceiros não passa de uma forma de preencher um vazio que na verdade é nosso: queremos buscar amor e realização em um lugar que não existe.
Quem nunca ouviu um torcedor fanático no dia posterior a uma vitória andando que nem galo, vestido com a camisa do time e vibrando: “Eu ganhei, eu ganhei!!!!”, ou quando ele é mais humilde fala: “Nós ganhamos!”. Ganhou o quê? Você não ganhou nada meu amigo: os jogadores ganharam. Você só ganhou um sentimento de felicidade porque ainda não descobriu que a vida deles não é a sua. Você foi lá, chutou a bola? Ganhou milhares de reais? Não, não, não e não. Então, por que você ganhou algo? Você ganhou foi uns reais a menos na sua conta bancária e algumas brigas e chacotas com pessoas que não são do seu time e que adoram ”se zoar”.
Algo igualmente interessante acontece quando o torcedor “perde”. Ele chora, sofre, pensa que ELE perdeu e que ele será zoado pelos amiguinhos adversários, enquanto na verdade foi só um jogo, só um time que não jogou tão bem e que não conseguiu completar o destino final. ”Não deu, fica para a próxima”, mas poucos conseguem pensar assim. O povo sofre, se desespera, se descabela. Parece até que eles estavam perdendo um dente sem anestésicos e sem poder colocar um novo dente no lugar.
Não estou aqui falando de uma atitude egoísta, do ”cada um cuida da própria vida e que se dane os outros”. Não é nada disso. Inclusive, acho legal essa ideia da parceria, de todo mundo ir junto, de rir, de fazer um social. O que não acho legal é ter um sentimento visceral exagerado que te faz perder o foco da sua vida, que é o que realmente importa.
Você já se imaginou vitorioso? Já tentou batalhar para conseguir um emprego melhor? Para sair desse relacionamento de merda que você vive e não abre mão porque é inseguro demais para isso? Já pensou em fazer algo que ninguém fez, ao invés de ficar seguindo as modinhas que te ensinam e que você, com preguiça de pensar e de ralar, nunca pensou que poderia ser diferente? Então por que se espelhar tanto na vida dos outros, se você mal tem tempo para regar as suas flores? A parceria e um ombro amigo é fundamental, mas nada de exageros. Você pode sim torcer, botar fé que vai dar certo, mas não espelhe a vitória e o orgulho na vida dos jogadores ou de qualquer outro hobby que você tenha na sua vida: espelhe na sua própria trajetória e conquiste a SUA vitória.
É você que será o jogador capaz de construir uma nova realidade através dos membros da escola que o seu filho estuda, que batalhará por um emprego digno, para quem sabe uma vez por ano fazer uma viagem decente com a sua família. É você que fará o gol da vitória quando nascer o seu primeiro filho e você ganhar mais um novo diploma de um curso legal que você fez por aí. É você também que sofrerá muitas derrotas, relações dilaceradas, talvez até a morte de um filho ou um ente querido, mas que será capaz de sair de tudo isso com força, fazendo uma nova estrutura técnica para a sua vida: literalmente balançando o time e mudando jogo. Essa partida sim, é sua. No jogo dos outros é “Boa sorte, conte comigo, mas eu não posso viver a sua vida enquanto não terminar a minha”.
Qual é a vantagem em ser o país do futebol quando não se tem mais nada fora isso?